O Tempo dos Maduros
Mário de Andrade
Contei meus anos e descobri que terei menos
tempo para viver daqui para
frente do que já vivi até agora.
Tenho muito mais passado do que futuro.
Sinto-me como aquele menino que ganhou uma bacia
de jabuticabas. As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam
poucas, rói
o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos
inflados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem
eles admiram, cobiçando
seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis,
para discutir assuntos
inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da
minha.
Já não tenho tempo para administrar melindres de
pessoas, que apesar da
idade cronológica, são imaturos.
Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram
pelo majestoso cargo de
secretário geral do coral.
As pessoas não debatem conteúdos, apenas os
rótulos. Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência,
minha alma tem pressa...
Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao
lado de gente humana, muito humana, que sabe rir de seus tropeços, não se
encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua
mortalidade...
Só há que caminhar perto de coisas e pessoas de
verdade.
O essencial faz a vida valer a pena.
E para mim, basta o essencial!
Mário de Andrade, contista, crítico, ensaísta,
escritor, ficcionista, folclorista, poeta e professor de nacionalidade
brasileira. Mário Raul de Morais Andrade. Nasceu em 9 de outubro de 1893, em
São Paulo. Faleceu em 25 de fevereiro de 1945, em São Paulo, com 51 anos de
idade. Representante fundamental do modernismo.
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