sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Cultura Nordestina - Morreu de Uma Burrada


Morreu de Uma Burrada

Raimundo Patrício Gomes é um pequeno produtor rural, dono de uma roça de 100 tarefas (aproximadamente 30 ha) localizada no distrito de Muquém, na cidade de Brejo Santo, Ceará. Lá ele criava um gadinho e também plantava um pouco de milho e de feijão.

Por causa da seca de 1997 ele perdeu tudo o que tinha plantado o que o fez pensar: “Se ao menos eu tivesse um poço profundo ou uma cacimba, poderia irrigar a plantação e ter colhido alguma coisa”.

Como o Governo Federal, sensível aos problemas provocados pela estiagem, resolveu abrir uma linha de crédito especial, com condições subsidiadas, para os produtores rurais do Nordeste do Brasil, o nosso herói não perdeu tempo. Foi direto ao Banco do Nordeste e fez um empréstimo para construir a sua cacimba.

Depois que assinou o contrato, o Raimundo era todo prosa. Sabia que agora o seu destino mudaria, pois teria condições de enfrentar uma estiagem. E tudo isso com a simples ajuda de um poço.

Porém, depois de já ter recebido as duas primeiras parcelas do empréstimo (faltando receber a última parte do empréstimo que só sairia depois que o poço estivesse construído e com a motobomba instalada e tudo funcionando nos conformes) para surpresa de todos, apareceu na agência  triste, abatido, com um ar preocupado. Indagado sobre o que tinha acontecido respondia enigmaticamente :

“Um desastre. Estou arruinado. Preciso falar com o gerente. Só ele pode me acudir.”

Levado ao gerente confidenciou:

-      “Seu” gerente. Preciso saber se o senhor pode liberar a última parcela do meu empréstimo para construir o poço.
-      Claro. Se o seu poço estiver concluído lhe entregamos o dinheiro agora mesmo.
-      O pior, “Seu” gerente, é que não está pronto não. Mas eu preciso do dinheiro mesmo assim.
-      Mas o que foi que houve para tanta tristeza e agonia?
-      Sabe o que foi? É que o moço que eu contratei para cavar o poço morreu e preciso do dinheiro para ajudar no enterro e para limpar o poço.
-      Mas o senhor não disse que o poço ainda não está pronto? Por que então precisa limpá-lo?
-      É que o moço morreu dentro do poço.
-      Ah, coitado. Mas morreu de que?
-      Morreu de uma burrada.
-      Mas como assim? Que foi que o moço fez de tão estúpido para morrer?
-      Não, “Seu” gerente. Não fez nada, não.
-      Agora eu não estou entendo é mais nada. O senhor não disse que ele morreu de uma besteira que ele fez?
-      Não. Eu disse que ele morreu de uma burrada.
-      Pois então, não é a mesma coisa?
-      Não, não é!
-      Então me explique isso. Me conte como foi que ele morreu.
-      É que o moço que cavava o poço morava muito longe da minha propriedade. Por isso ele vinha trabalhar, todo dia, no lombo de um burro. Só que, “onti” ele esqueceu de amarrar o burro.
-      Sim, daí?
-      Aí, o burro começou a pastar. Comeu aqui, comeu ali e de repente, o burro mexeu onde não devia e algum bicho assustou ele. Tenho prá mim que foi coisa de cobra.
-      Sim, homem. Conte logo. Falou o gerente ansioso pelo desfecho.
-      Pois bem. No susto, o burro desembestou a correr e na correria acabou caindo dentro do poço. Morreu o burro e, pior, matou o moço, que cavava o poço. O senhor entendeu agora? Ele morreu de uma burrada.

Max Albuquerque

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